segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Canção de Excelência







EXCELÊNCIA

É um canto entoado à cabeça dos moribundos ou dos mortos, cerimonial de velório, ainda existente na Paraíba, Rio Grande do Norte e Pernambuco e possivelmente noutros estados. Cantam sem acompanhamento instrumental, em uníssono, em série de doze versos, ritualmente.

Gonçalves Fernandes (Folclore mágico do nordeste, 67): "As excelências são cantadas ao pé do morto, enquanto os benditos são cantados à sua cabeça".

Informa Aluísio Alves (Angicos, 320): "Acreditava-se que a inselência tinha o poder de despertar no moribundo o horror ao pecado, incitando-o ao arrependimento. Ainda em 1937, vi ser chamada de Angicos para um sítio distante uma dessas velhas cantoras de inselências… das pessoas que cercam o doente, deitado numa rede, e raramente, em cama, umas se destacam para receber à porta o sacerdote, sempre cantando, e as outras permanecem no mesmo lugar".

Gonçalves Fernandes regista músicas das excelências. Aluísio Alves informa que não são unicamente cantadas aos doentes e aos defuntos, mas pertencem às rogativas contra o perigo da peste e tempestade. Getúlio César (Crendices do nordeste, 139-142) escreve que a excelença facilita a entrada no céu, e são frases rimadas, indo sempre do número um até doze.

Uma excelença que Nossa Senhora deu a Nosso Senhor
Esta excelença é de grande valor
Duas excelenças que Nossa Senhora deu a Nosso Senhor,

Três excelenças…

Há a excelência das horas: Já é uma hora que os anjos vieram te ver / E ele vai, e ele vai, e ele vai também com você / Já são duas horas, etc.

"Retirando-se o cadáver para o enterro, no momento em que estão cantando uma excelença, as cantadeiras acompanham o cortejo até terminá-la, porque, dizem, quando se principia a cantar uma excelença, Nossa Senhora se ajoelha para só se levantar quando terminam, e não sendo terminada, ela ficará de joelhos e, o espírito, devido a esse desrespeito, não ganhará a salvação". (Getúlio César, cit. 142)

As excelências são igualmente cantadas em Portugal (Jaime Lopes Dias, Etnografia da Beira, IIIº, 59, Lisboa, 1929). Certos romances de origem bíblica, cantados em Marrocos, não podem ser interrompidos…. Cuando se principian a cantar es obligatorio acabarlos (Ramon Menéndez Pidal, El Romancero, 124, Madri, sd).

Sobre as Inselencias (excelências) ver José Nascimento de Almeida Prado (Trabalhos fúnebres na roça, 42-56, separata daRevista do Arquivo, CXV, São Paulo, 1947, com documentário musical e registo do cerimonial).

As excelências são cantadas em Portugal também na região do Douro e Minho. Augusto César Pires de Lima (Estudos etnográficos, filológicos e históricos, 3º, 183-194, Porto, 1948) regista Doze excelências que deu o Senhor à Senhora da Graça e anota: "Cantam-nas as omeiras, primeiro uma vez; a seguir começam:duas excelências, etc. e a cantam-na duas vezes; depois três excelências, etc, três vezes, e assim por diante, até doze. É pecado começar a oração, não a acabando."
(CASCUDO, Luís da Câmara. Dicionário do folclore brasileiro. Rio de Janeiro, Ministério da Educação e Cultura / Instituto Nacional do Livro, 1954.)

INCELÊNCIAS
Prática do catolicismo popular, relativamente freqüente em Pernambuco, no interior de modo especial, é a das incelências, também chamadas de excelências ou incelenças, são cantos entoados à cabeceira dos moribundos ou dos mortos. Uma espécie de ritual de velório, com benditos e as frases apenas rimadas. São práticas que escapam da ortodoxia cristã ainda usadas com freqüência em Pernambuco. Getúlio Cesar diz que a excelênça facilita a entrada do morto no céu, sendo as frases rimadas sempre em número de 1 a 12, quando se trata de adulto, e, de 1 até 9, quando é criança. A seguinte incelença merece ser registrada:

Uma incelença que nossa senhora deu a nosso sinhô.
Essa incelença é de grande valô.

Assim cantam duas, três, até doze incelenças. o número doze representa o número de apóstolos de Cristo.

A música é sempre a mesma, monótona e lúgubre.

Esta outra incelença segue no mesmo refrão:

Já é uma hora, os anjos vinhero te vê
E ele vai, e ele vai, e ele vai também com você.

Em seguida:

Uma incelença que nos deu senhô Deus
Sinhora da Graça livrai-me da peste. Ave-Maria.

Segundo Gétulio Cesar, esta incelença faz pensar no medo da morte sem o preparo religioso:

Uma incelença à virge da Conceição
Deus não permita que eu morra sem confissão.

Aqui um exemplo que as cantadeiras consideram complicado:

Uma incelença da estrela matrona;
Galho de Alecrim, rosa manjerona
De portas em portas, de ruas em ruas
Meu Deus padecendo sem culpa nenhuma.

As excelenças começam no cerimonial de fazer quarto e se prolongam no acompanhamento do cortejo fúnebre até o cemitério. As cantadeiras são, às vezes, acompanhadas de carpideiras, isto é, mulheres especialmente contratadas e pagas para chorar o defunto. Na saída do enterro cantam a excelença da despedida, que tem também a função de preparar o morto;

Lá vem uma alma,
Pisando no chão
Vai dizendo a outra:
Ou que buracão.

Esse buracão
É a sepultura;
Essa terra fria
É a cobertura.

Uma incelença
Que nos deu no paraíso
Adeus, irmão, adeus
Até o dia do juízo
(VALENTE, Waldemar. Folclore brasileiro: Pernambuco. Funarte, 1979)


Uma incelença que é pra ele
Uma incelença que é pra ele
Mãe de Deus, Mãe de Deus
Oh! Mãe de Deus, rogai a Deus por ele
Oh! Mãe de Deus, rogai a Deus por ele

Duas incelenças que é pra ele…
*     *    *
Uma incelência, minha Virgem do Rosário
Que do vosso ventre se abriu num sacrário
Sacrários abertos, saiu o Senhor fora
Receber um’alma que vai para a glória

Duas incelências, minha Virgem do Rosário
Que do vosso ventre se abriu num sacrário
Sacrários abertos, saiu o Senhor fora
Receber um’alma que vai para a glória

Três incelências, minha Virgem do Rosário…"

(Música Popular do Sul. v. 2. Discos Marcus Pereira)

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